21 de abril de 2011

Assim caminha a humanidade...

A religião, a ideologia, a economia e os sistemas políticos são todos criações do homem. Sendo assim, precisam estar relacionados com os sentimentos humanos e com o espírito humano. Quando são praticados com sentimentos humanos, são capazes de satisfazer algumas aspirações humanas fundamentais. As diversas religiões e ideologias existem em função da humanidade, não da desumanidade. (Dalai Lama, O Livro de Dias, Sextante)

15 de abril de 2011

Não se prender a opiniões



É um prazer falar com alguém que não sabe tudo, que tem a mente aberta e vontade de ouvir. Nessa mente há uma presença deliciosa, há receptividade e humildade. O Terceiro Patriarca zen diz o seguinte: “Se você quer conhecer a verdade, basta parar de alimentar opiniões”. No mais antigo dos textos budistas, o Sutta Nipata, o Buda levanta essa questão, terminando com uma bem-humorada cutucada nos que tem opiniões:




Vendo infelicidade em visões e opiniões, sem adotar nenhuma, encontrei paz interior e liberdade. Quem é livre não se agarra a visões nem discute opiniões. Para um sábio, não há superior, inferior nem igual; não há lugares em que a mente possa se fixar. Mas os que se prendem a visões e opiniões andam pelo mundo aborrecendo as pessoas.








Jack Kornfield (EUA, 1945 ~)

“Depois do êxtase, lave a roupa suja”

7 de abril de 2011

O Poder da Paz

Chagdud Tulku RinpocheChagdud Tulku Rinpoche (1930-2002) pertencia à última geração de mestres que herdaram os tesouros dos ensinamentos e métodos Vajrayana. Filho de Dawa Drolma, uma das mais célebres mulheres lamas deste século, abade do secular monastério de Chagdud Gonpa no Tibet, Rinpoche viveu os primeiros vinte anos de exílio, depois da invasão chinesa de 1959, na Índia e no Nepal. Lá serviu à comunidade tibetana como lama, médico e promotor das artes.




Em 1979, chegou aos Estados Unidos. Quatro anos depois, Rinpoche criou a Chagdud Gonpa Foundation, hoje com centros também no Canadá, Suíça e Brasil, onde residia em Três Coroas (RS).

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É meu desejo que o poder espiritual da paz toque as mentes de todas as pessoas na terra, irradiando da profunda paz de nossas próprias mentes, vencendo as barreiras políticas e religiosas, vencendo as barreiras do ego e da rigidez conceitual. A nossa primeira tarefa como pacifistas é limpar nossas mentes dos conflitos mentais causados pela ignorância, raiva, apego, inveja e orgulho. Os mestres espirituais podem nos guiar na purificação destes venenos e, através desta purificação, podemos aprender a essência da arte de promover a paz.



A paz interior que procuramos deveria ser tão absolutamente pura, tão estável, de modo que seja impossível de ser transformada em raiva por aqueles que vivem e lucram com a guerra, ou transformada em apego e medo ao se confrontar com o desprezo, o ódio e a morte. É necessária uma paciência infinita para se conquistar qualquer aspecto da paz mundial e a fonte desta paciência é o espaço de paz interior de onde você pode reconhecer, com perfeita clareza, que a guerra e o sofrimento são os reflexos externos dos venenos internos da mente.



Se você realmente entende que a verdadeira diferença entre os que fazem a paz e os que fazem a guerra é que aqueles que buscam a paz têm disciplina e controle sobre a raiva, o apego e a inveja egoístas, enquanto que os que fazem a guerra, em sua ignorância, manifestam os resultados destes venenos no mundo – se você verdadeiramente entende isso, você nunca se permitirá ser vencido por fatores externos ou internos.



Os budistas tibetanos usam o pavão como um símbolo do bodhisattva, o Guerreiro Desperto que trabalha pela iluminação de todos os seres sencientes. Diz-se que o pavão se alimenta de plantas venenosas e as transmuta nas cores brilhantes de suas penas. O pavão não se envenena, assim como nós, que desejamos a paz, não nos envenenamos.



Ao encontrar os poderosos do mundo, sentados sobre suas máquinas de guerra, considere-os com estrita equanimidade. Argumente tão bem quanto você for capaz, mas esteja constantemente alerta para o estado de sua mente. Se começar a sentir raiva, recue. Se puder continuar sem raiva, talvez penetre no delírio terrível que causa a guerra e todos os seus sofrimentos infernais. Do claro espaço de sua paz interior, a compaixão deve se expandir para incluir todos os envolvidos na guerra – os soldados, apanhados pelo karma cruel de matar, que sacrificam seu renascimento precioso; os generais e políticos que querem trazer benefícios, mas causam destruição e morte; os civis, que são feridos, mortos e se tornam refugiados. A verdadeira compaixão é absolutamente neutra e abarca todos os tipos de sofrimento, sem se prender a certo ou errado, apego ou aversão.



O trabalho pela paz é, por si só, um caminho espiritual, um meio de desenvolver as qualidades perfeitas da mente e testar essas qualidades nos momentos de urgente necessidade, sofrimento extremo e morte. Não tenha medo de dedicar seu tempo, energia e riqueza.



(Chagdud Tulku Rinpoche. The Power of Peace. In: Ordinary Magic: Everyday life as Spiritual Path.

Editado por John Welwood. Shambhala, 1992. Pág. 291-292.)





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http://www.dharmanet.com.br/vajrayana/chagdud4.htm

5 de abril de 2011

Falsa noção do eu


Como seres humanos, somos profundamente inseguros e não sabemos quem realmente somos. Claro que esse problema não se mostra no nível superficial de nossas vidas. Estamos constantemente dizendo a nós mesmos quem somos, baseados nessa ideia de que estamos separados de tudo mais. Essa sensação de “eu sou separado” é a base do nosso senso de “eu”. Isso é reforçado pelas diversas identidades falsas às quais nos apegamos, noções como “eu sou isso” ou “eu sou aquilo”. Quaisquer crenças que tenhamos sobre nós mesmos são apenas extensões desse tema.



Na maioria das vezes em que olhamos em volta, imediatamente vemos que nosso ambiente valida essas falsas identidades. Por isso, é um esforço desafiador desconstruir essa ilusão do eu. Sempre que olhamos no espelho podemos ter algum pensamento sobre nós mesmos. Cada um desses pensamentos aumenta o efeito. Eles se tornam os tijolos conceituais que usamos para continuar construindo o castelo ilusório do eu.



No entanto, há a suspeita de que essa noção do eu pode ser muito frágil e tansitória; esse pensamento fica silenciosamente se esgueirando em algum lugar de nossa mente. Na maioria das vezes, essa suspeita não é trazida à luz da consciência, mas se for, uma sabedoria interior profunda surgirá certamente.



Nossa suspeita sobre a fragilidade dessa falsa noção do eu pode ir em duas direções. Em geral, ela se torna a fonte do medo, ansiedade e insegurança. Frequentemente vemos pessoas temerosas e excessivamente defensivas no que se refere às suas próprias identidades. Nós mesmos temos a tendência de nos amedrontar caso nossa identidade seja ameaçada. Mas em outras vezes a suspeita pode ir em outra direção. Quando isso acontece, pode acontecer uma revelação de mudar a vida, que nos leva para a realização do nível mais elevado da verdade.



Essa ideia não é nenhuma nova super-teoria. Trata-se de uma sabedoria imemorial que já foi realizada por muitas pessoas na história humana. O Buda ensinou essa sabedoria, e em sua tradição isso é chamado de “anatman” ou “não-eu”. Esse é o termo usado para indicar que uma pessoa desnudou essa falsa noção do eu. Ela percebeu que essa sensação é apenas uma identificação com os papéis representados na vida. É apenas uma máscara, não a verdade.



Anam Thubten

“No Self, No Problem”

(Dharma Quote of The Week – Snow Lion, 28/10/10)



Leia mais em: http://www.saindodamatrix.com.br/archives/2009/03/o_eu_no_budismo.html

4 de abril de 2011

Ilusão da raiva


Há um velho koan sobre um monge que foi até seu mestre e disse:

– Sou uma pessoa com muito raiva. Quero que você me ajude.

O mestre falou:

– Me mostre sua raiva.

O monge respondeu:

– Bem, no momento não estou nervoso. Não posso mostrá-la.

E o mestre:

– Então, obviamente, isso não é você, já que às vezes a raiva nem está aí.

Quem somos tem muitas faces, mas essas faces não são aquilo que somos.



Charlotte Joko Beck, em “Everyday Zen”.

Tricycle’s Daily Dharma: 8 de julho, 2007.

3 de abril de 2011

Einstein e o budismo

Os elogios de Albert Einstein ao budismo costumam ser muito citados. Principalmente quando os ouvintes levam em grande consideração as conquistas materiais e científicas. Como esse:




“O budismo tem as características do que se esperaria de uma religião cósmica para o futuro.”



Já a citação a seguir é quase como um síntese do budismo:



“Um ser humano é parte de um todo chamado por nós de “Universo”, é uma parte limitada no tempo e no espaço. Ele experiencia a si mesmo, seus pensamentos e sentimentos, como alguma coisa separada do resto ─ uma espécie de ilusão de ótica de sua consciência. Essa ilusão é uma forma de prisão para nós, restringindo-nos aos nossos desejos pessoais e à afeição por umas poucas pessoas próximas. Nossa tarefa deve ser a de nos libertarmos dessa prisão alargando nossos círculos de compaixão para envolver todas as criaturas vivas e o todo da natureza em sua beleza.”



Albert Einstein, “Ideas and Opinions” , 1954, citado em “O Livro Tibetano do Viver e do Morrer”, de Sogyal Rinpoche

Fonte: Blog Samsara

1 de abril de 2011

Japão e a influência do budismo no comportamento

JAPÃO - por Monja Coen Sensei


Quando voltei ao Brasil, depois de residir doze anos no Japão, me incumbi da difícil missão de transmitir o que mais me impressionou do povo Japonês: kokoro.



Kokoro ou Shin significa coração-mente-essência.



Como educar pessoas a ter sensibilidade suficiente para sair de si mesmas, de suas necessidades pessoais e se colocar à serviço e disposição do grupo, das outras pessoas, da natureza ilimitada?



Outra palavra é gaman: aguentar, suportar. Educação para ser capaz de suportar dificuldades e superá-las.



Assim, os eventos de 11 de março, no Nordeste japonês, surpreenderam o mundo de duas maneiras.



A primeira pela violência do tsunami e dos vários terremotos, bem como dos perigos de radiação das usinas nucleares de Fukushima.



A segunda pela disciplina, ordem, dignidade, paciência, honra e respeito de todas as vítimas.



Filas de pessoas passando baldes cheios e vazios, de uma piscina para os banheiros.



Nos abrigos, a surpresa das repórteres norte americanas: ninguém queria tirar vantagem sobre ninguém. Compartilhavam cobertas, alimentos, dores, saudades, preocupações, massagens. Cada qual se mantinha em sua área. As crianças não faziam algazarra, não corriam e gritavam, mas se mantinham no espaço que a família havia reservado.



Não furaram as filas para assistência médica – quantas pessoas necessitando de remédios perdidos – mas esperaram sua vez também para receber água, usar o telefone, receber atenção médica, alimentos, roupas e escalda pés singelos, com pouquíssima água.



Compartilharam também do resfriado, da falta de água para higiene pessoal e coletiva, da fome, da tristeza, da dor, das perdas de verduras, leite, da morte.



Nos supermercados lotados e esvaziados de alimentos, não houve saques. Houve a resignação da tragédia e o agradecimento pelo pouco que recebiam. Ensinamento de Buda, hoje enraizado na cultura e chamado de kansha no kokoro: coração de gratidão.

Sumimasen é outra palavra chave. Desculpe, sinto muito, com licença. Por vezes me parecia que as pessoas pediam desculpas por viver. Desculpe causar preocupação, desculpe incomodar, desculpe precisar falar com você, ou tocar à sua porta. Desculpe pela minha dor, pelo minhas lágrimas, pela minha passagem, pela preocupação que estamos causando ao mundo.



Sumimasen. Quando temos humildade e respeito pensamos nos outros, nos seus sentimentos, necessidades. Quando cuidamos da vida como um todo, somos cuidadas e respeitadas.



O inverso não é verdadeiro: se pensar primeiro em mim e só cuidar de mim, perderei. Cada um de nós, cada uma de nós é o todo manifesto.



Acompanhando as transmissões na TV e na Internet pude pressentir a atenção e cuidado com quem estaria assistindo: mostrar a realidade, sem ofender, sem estarrecer, sem causar pânico.



As vítimas encontradas, vivas ou mortas eram gentilmente cobertas pelos grupos de resgate e delicadamente transportadas – quer para as tendas do exército, que serviam de hospital, quer para as ambulâncias, helicópteros, barcos, que os levariam a hospitais.



Análise da situação por especialistas, informações incessantes a toda população pelos oficiais do governo e a noção bem estabelecida de que “somos um só povo e um só país”.



Telefonei várias vezes aos templos por onde passei e recebi telefonemas. Diziam-me do exagero das notícias internacionais, da confiança nas soluções que seriam encontradas e todos me pediram que não cancelasse nossa viagem em Julho próximo.



Aprendemos com essa tragédia o que Buda ensinou há dois mil e quinhentos anos: a vida é transitória, nada é seguro neste mundo, tudo pode ser destruído em um instante e reconstruído novamente.



Reafirmando a Lei da Causalidade podemos perceber como tudo está interligado e que nós humanos não somos e jamais seremos capazes de salvar a Terra. O planeta tem seu próprio movimento e vida. Estamos na superfície, na casquinha mais fina. Os movimentos das placas tectônicas não tem a ver com sentimentos humanos, com divindades, vinganças ou castigos. O que podemos fazer é cuidar da pequena camada produtiva, da água, do solo e do ar que respiramos. E isso já é uma tarefa e tanto.



Aprendemos com o povo japonês que a solidariedade leva à ordem, que a paciência leva à tranquilidade e que o sofrimento compartilhado leva à reconstrução.



Esse exemplo de solidariedade, de bravura, dignidade, de humildade, de respeito aos vivos e aos mortos ficará impresso em todos que acompanharam os eventos que se seguiram a 11 de março.



Minhas preces, meus respeitos, minha ternura e minha imensa tristeza em testemunhar tanto sofrimento e tanta dor de um povo que aprendi a amar e respeitar.



Havia pessoas suas conhecidas na tragédia?, me perguntaram. E só posso dizer : todas. Todas eram e são pessoas de meu conhecimento. Com elas aprendi a meditar, a ter confiança, paciência, persistência. Aprendi a respeitar meus ancestrais e a linhagem de Budas.



Mãos em prece (gassho)



Monja Coen

fonte: http://opicodamontanha.blogspot.com/2011/04/japao-e-influencia-do-budismo-no.html